O silêncio no deserto parecia ser impenetrável. A figura do Guardião da Verdade ainda pairava diante de Ryouma e Tang San, como uma presença massiva, desafiando qualquer um que ousasse questionar suas intenções. O ar estava pesado, carregado com a energia do poder que agora habitava os corpos dos dois jovens, e cada palavra proferida pelo Guardião reverberava com uma força quase sobrenatural.
Ryouma estava tenso. Ele podia sentir o peso das palavras que o Guardião acabara de dizer, e a dor profunda que vinha com o conhecimento de que o que ele via, a imagem de seus pais e a vida que nunca teve, era uma ilusão construída pela própria energia que ele agora possuía. Mas, por outro lado, a sensação de poder dentro dele era inebriante, um vício irresistível que queimava em suas veias.
— Não me importo com o que poderia ter sido. — Ryouma finalmente disse, sua voz firme e cheia de determinação. Ele não queria mais olhar para o passado. O futuro era o que importava. — Eu tomei minha decisão. Vou seguir em frente.
O Guardião da Verdade o observou em silêncio, mas havia algo nos olhos dele que sugeria uma certa compreensão. Ele sabia o que estava por vir. O preço que Ryouma estava disposto a pagar ainda não era claro para ele, mas estava prestes a descobrir.
Tang San, por outro lado, estava em um estado completamente diferente. Ele sabia que o poder era tentador, mas seu olhar ainda estava fixo na cena que havia se formado à sua frente. Ele via a versão alternativa de sua vida, onde sua família estava intacta, onde ele ainda tinha a chance de viver uma vida simples e tranquila. Mas esse era um caminho que ele sabia que nunca mais poderia seguir. Ele já havia feito sua escolha quando entrou naquele mundo desconhecido, mas o peso da decisão agora parecia mais pesado do que nunca.
— Ryouma, você realmente não sente nada? — Tang San perguntou, a dúvida em sua voz clara e crescente. — Olhe para isso! O que vemos aqui, o que o Guardião nos mostrou, não é um simples reflexo do que poderíamos ter sido. É a prova de que nossas escolhas têm consequências. Você está disposto a pagar o preço?
Ryouma virou-se para ele, os olhos brilhando com uma determinação feroz.
— Não tenho tempo para arrependimentos, Tang San. O poder que agora possuímos é o único caminho para alcançar o que queremos. E se isso significar sacrificar o que sobrou de nossa humanidade, então que assim seja. Eu não vou voltar atrás.
O Guardião da Verdade olhou para os dois com uma expressão sombria. Ele já sabia o que aconteceria a seguir. Mas o verdadeiro teste ainda estava por vir. Ele sabia que o que estava prestes a acontecer não seria uma simples batalha física, mas uma luta interna. O poder que eles haviam adquirido começaria a corroer suas mentes e corações, e seria necessário mais do que força para resistir às tentações que o futuro lhes reservava.
— Muito bem, então. — A voz do Guardião soou, agora mais profunda e cheia de uma energia quase palpável. — Vocês escolheram o caminho da escuridão. Mas lembrem-se, esse caminho não é sem suas armadilhas. A tentação do poder é uma das mais perigosas que um ser pode enfrentar. E, ao que parece, a linha entre a salvação e a destruição será tênue para vocês.
A areia ao redor deles começou a agitar novamente, mas dessa vez não eram imagens do passado que surgiam. Em vez disso, o deserto começou a se transformar, se distorcendo como se estivesse se tornando uma extensão do próprio poder que habitava os corpos dos dois jovens. Figuras começaram a aparecer, sombras que se moldavam em humanos, mas com características monstruosas. Suas feições estavam distorcidas, como se fossem refletidas em um espelho quebrado.
Essas figuras estavam se aproximando, e Ryouma e Tang San logo perceberam que não eram apenas ilusões. Elas eram uma manifestação das próprias sombras de seus desejos e medos, uma personificação do poder que haviam escolhido.
— O que são essas coisas? — Tang San perguntou, sua voz tensa e cheia de cautela.
O Guardião da Verdade observou as figuras com um olhar impassível, como se já esperasse por isso.
— São as manifestações das dúvidas e tentações que agora residem em seus corações. O poder que adquiriram se reflete na forma das suas escolhas, e essas criaturas são uma representação de tudo o que poderiam se tornar caso sucumbam às suas próprias fraquezas.
Ryouma encarou as figuras com um sorriso frio. Ele estava determinado. Nada iria tirá-lo do caminho que escolhera. O poder que havia buscado agora estava ao alcance de suas mãos, e nada mais importava. Com um movimento rápido, ele sacou sua espada e avançou em direção a uma das figuras, cortando-a com um único golpe. A sombra se dissipou em uma nuvem de energia negra, mas a sensação de triunfo foi breve. Outra sombra apareceu em seu lugar.
— Você não pode cortar o que está dentro de si mesmo, Ryouma. — A voz do Guardião ecoou, uma advertência clara. — O verdadeiro inimigo não está à sua frente, mas dentro de você.
Ryouma hesitou por um momento. Ele sentia a pressão do poder em seu interior, a chama ardente que queimava em suas veias. Mas ele não iria parar. Ele havia feito sua escolha, e nada poderia fazê-lo recuar agora.
— Eu sou mais forte do que isso. — Ele murmurou para si mesmo, sua expressão endurecendo. Ele cortou outra sombra, e outra, sem piedade, até que o deserto parecia vazio novamente.
Tang San estava de pé, observando a cena com uma crescente sensação de desconforto. Ele sabia que, apesar da bravura de Ryouma, algo estava errado. Ele podia sentir a energia dentro dele também, uma força que o atraía de maneira sedutora. Mas ele resistia, consciente de que aquilo era o que o Guardião chamara de tentação. Ele precisava manter a clareza de seu objetivo.
— Ryouma, você está perdendo o controle. — Tang San gritou, sua voz cheia de urgência. — Não deixe que o poder controle você. O que estamos enfrentando aqui não é um inimigo físico, é algo muito mais profundo. Não deixe que a escuridão tome conta de você.
Ryouma parou, sua respiração pesada, mas sua expressão permanecia inabalável.
— Eu não sou fraco, Tang San. — Ele respondeu, sua voz implacável. — Não vou cair nas armadilhas do Guardião. Isso tudo é apenas um teste. Eu sou o mestre do meu próprio destino.
O Guardião da Verdade observou o que acontecia, mas não disse nada. Ele sabia que o caminho para a corrupção estava sendo trilhado. Ryouma e Tang San estavam próximos do limite, e a linha entre controle e perda seria rapidamente apagada.
As figuras sombrias começaram a se aproximar mais uma vez, desta vez mais numerosas e mais agressivas. Elas formavam uma pressão que parecia imensurável, como se estivessem tentando engolir os dois.
Mas algo começou a mudar dentro de Ryouma. Ele sentiu a chama ardente dentro dele começar a se expandir, consumindo não apenas seu corpo, mas sua mente e espírito. Ele não sabia o que estava acontecendo, mas a energia dentro dele estava crescendo, tornando-se mais intensa, mais imprevisível. Ele sentia que o poder estava começando a dominá-lo.
— Eu... preciso de mais! — Ele gritou, sua voz cheia de desespero e desejo. Ele queria mais poder, mais força, mais controle. E a escuridão dentro dele estava apenas começando a crescer.
Tang San olhou para Ryouma com uma expressão de horror. Ele sabia que seu amigo estava se perdendo. O Guardião da Verdade tinha razão: o poder tinha seu preço. E agora, Ryouma estava prestes a pagá-lo.