A escada parecia mais longa agora. Ou talvez fosse a sensação de que o tempo estava se esticando, como se cada passo os aproximasse de algo muito mais sombrio. O calor das últimas provações ainda se fazia sentir nos corpos de Ryouma e Tang San, mas o alívio momentâneo de terem superado o Terceiro Véu logo foi substituído por um peso silencioso, como uma nuvem escura pairando sobre suas cabeças.
O Sistema Arkanum ainda pulsava em sua mente, mas parecia mais distante, como se estivesse aguardando algo — uma decisão, uma mudança. As mensagens haviam cessado, e o ar ao redor deles parecia estar mais pesado, mais espesso, como se cada respiração fosse uma luta para não afundar na espiral de incertezas que os aguardava.
Tang San olhou para o companheiro de jornada, seus olhos refletindo algo mais profundo do que o usual. Ryouma notou a mudança imediata, mas não disse nada. Sabia que, no fundo, Tang San estava se questionando, e talvez até temendo, os próximos passos.
— Estamos mais perto... do fim? — perguntou Ryouma, quebrando o silêncio.
Tang San olhou para ele, o rosto impassível.
— Não sei. Mas o que quer que esteja à frente, vai nos mudar para sempre.
Ryouma assentiu. Ele também sentia que o próximo Véu era algo que iria desafiá-los de maneira completamente diferente.
O quarto Véu se aproximava. E enquanto a escada chegava ao seu fim, uma nova sensação de opressão tomou conta deles. O último Véu não seria fácil, disso eles tinham certeza. As consequências de suas escolhas estavam se acumulando, e o futuro parecia ser mais incerto do que nunca.
Finalmente, o ambiente ao redor deles mudou, se distorcendo como se o próprio espaço estivesse sendo reescrito. O som da escada desapareceu, substituído por um ruído profundo e constante, como o som de um oceano em tempestade. Mas quando olharam ao redor, viram que estavam diante de um imenso abismo, as ondas do mar agitadas se estendendo até onde a visão podia alcançar. O horizonte estava obscurecido por uma neblina espessa, que obscurecia qualquer sinal de terra.
A mulher de olhos dourados apareceu novamente diante deles. Sua expressão era séria, como se já soubesse o que eles estavam prestes a enfrentar.
— Este é o Quarto Véu: O Véu da Escolha. — A voz dela era baixa, mas carregava um poder indescritível. — Aqui, vocês enfrentarão a verdadeira essência do destino. O que será destruído, o que será preservado, e o que será moldado por suas próprias mãos.
Ela ergueu a mão, e do abismo, uma figura começou a emergir. Era uma visão estranha e familiar ao mesmo tempo. Uma versão de Ryouma e Tang San, mas com uma aura distorcida, corrompida. Eles estavam acompanhados por uma figura encapuzada, cuja presença emanava uma pressão esmagadora.
— O que é isso? — Tang San perguntou, o olhar atento.
A mulher sorriu, mas a expressão parecia um pouco mais amarga.
— O que seriam se fizessem escolhas diferentes. O que seriam se abandonassem tudo pelo poder.
Ryouma sentiu seu estômago revirar. O que estava vendo não era apenas uma ilusão — era uma projeção daquilo que ele e Tang San poderiam se tornar. A distorção no tempo e espaço estava fazendo com que suas escolhas se desdobrassem em possibilidades infinitas.
Tang San olhou fixamente para a figura diante dele. Uma versão dele mesmo, mas com os olhos vazios de humanidade, empunhando o Martelo do Céu Claro com crueldade. Ao seu lado, o que parecia ser uma versão de Ryouma, mas com uma expressão de desdém, sua aura muito mais imponente, mais fria.
— Eu... eu nunca me tornarei assim. — A voz de Tang San tremia, não de medo, mas de uma raiva contida. — Não deixarei isso acontecer.
A mulher olhou para ele, a expressão distante.
— As escolhas que vocês fazem agora determinarão se isso se tornará realidade ou não. Mas lembrem-se... nem todas as escolhas podem ser desfeitas. Algumas linhas, uma vez traçadas, não podem ser apagadas.
O peso das palavras dela caiu sobre eles, e Ryouma não pôde deixar de sentir a verdade por trás de cada uma delas. Cada passo, cada decisão, cada emoção era uma linha que se estendia para o futuro. E, agora, não havia mais volta.
Ryouma se aproximou da borda do abismo, os olhos fixos na figura distorcida de si mesmo. Havia algo perturbador naquela imagem — uma versão de si que não reconhecia. Uma versão de si que, ao abraçar o poder sem restrições, perdera a humanidade.
— Eu preciso fazer isso — ele murmurou para si mesmo.
Ele sentia a pressão crescente em seu peito. As escolhas que ele fizera no passado haviam sido moldadas por suas próprias ambições e necessidades. Mas agora, ele percebia que, ao tentar ser mais forte, ele se afastava de tudo o que ele realmente desejava. Ele não queria ser o monstro que estava vendo diante de si.
Com um movimento rápido, ele avançou em direção à figura distorcida, os punhos prontos para a batalha. Mas, assim que se aproximou, a versão distorcida de si mesmo levantou a mão, parando-o no lugar. A energia ao redor se intensificou, e uma pressão esmagadora tomou conta dele.
— Não há mais caminho para voltar. Você já fez sua escolha. — A versão distorcida de Ryouma falou com uma voz fria e cortante. — O que você tentou evitar... é exatamente o que você se tornou.
Ryouma fechou os olhos, sentindo a dor de suas escolhas. Mas algo dentro dele se recusou a aceitar essa versão distorcida. Ele não seria consumido pela escuridão, não importa o que fosse necessário.
Com um grito primal, ele liberou todo o poder que estava guardado dentro de si, a energia explodindo em um fluxo avassalador. O abismo ao redor deles tremeu, a luz da energia se espalhando em todas as direções, iluminando as sombras e dissipando a distorção.
A versão distorcida de Ryouma desapareceu em um estalo, a pressão aliviada, e o abismo se acalmou.
Tang San, que havia observado em silêncio, se aproximou de Ryouma.
— O que aconteceu? — perguntou ele, os olhos buscando entender.
Ryouma olhou para o horizonte, as palavras da mulher ecoando em sua mente.
— Eu reescrevi meu próprio destino. E agora, o futuro... depende de nós.
A mulher, que ainda estava observando a cena com uma expressão enigmática, finalmente falou novamente.
— Quarto Véu concluído. Mas lembrem-se... o destino de vocês ainda não está selado. O próximo Véu será o mais difícil de todos. E ele virá com um preço que nenhum de vocês pode prever.
As palavras ficaram no ar, e antes que pudessem responder, o mundo ao seu redor começou a se desvanecer, levando-os em direção ao próximo teste.