O calor era sufocante. Não como o calor de um deserto, seco e abrasador, mas um calor denso, que parecia vir de dentro, fervendo os ossos, como se as emoções mais profundas estivessem sendo destiladas e queimadas ao mesmo tempo. O Terceiro Véu se abriu diante de Ryouma e Tang San como uma cortina flamejante, pulsando com uma energia primitiva.
Uma voz ecoou ao redor deles, reverberando na alma:
"Terceiro Véu: A Llama da Causalidade. Aqui, cada escolha do passado será confrontada com o preço que ela exigirá no futuro."
O cenário à frente se moldou lentamente. Era a academia Shrek, mas não como a conheciam. Estava em ruínas, tomada por trepadeiras negras e rachaduras profundas no solo. As paredes, antes brancas e firmes, estavam manchadas de sangue seco. O estandarte da Shrek jazia rasgado, pendurado como um aviso sinistro.
Ryouma franziu o cenho. Ele conhecia esse lugar. Não apenas da realidade atual, mas de visões que o Sistema Arkanum ocasionalmente deixava escapar — flashes de um futuro possível. A diferença é que, desta vez, tudo estava muito mais vívido.
— Isso... é um vislumbre do que vai acontecer? — ele murmurou, mas a pergunta não era dirigida a Tang San.
"Não," respondeu o Sistema, em sua forma fria e direta, falando diretamente dentro de sua mente. "É o que poderá acontecer. E mais do que isso: é o que acontecerá... se certas escolhas forem mantidas."
Tang San apertou os punhos.
— Essa destruição... não é inevitável.
— Mas é uma possibilidade real. — completou Ryouma, os olhos estreitando. — E o que esse Véu quer que façamos?
Antes que a resposta viesse, as chamas ao redor deles giraram, colapsando sobre si mesmas, até formar uma figura — uma mulher.
Alta, de longos cabelos vermelhos que flutuavam como chamas, e olhos dourados que perfuravam a alma. Ela vestia um manto de energia viva, e na mão segurava uma balança, cujo pêndulo oscilava com violência entre dois pesos: uma máscara e uma adaga.
— Bem-vindos à Encruzilhada — disse ela. — Aqui, a Causalidade será testada. O que vocês fizeram não pode ser desfeito... mas pode ser reescrito.
Tang San e Ryouma trocaram olhares.
— Reescrever o passado? — Tang San perguntou, cético.
— Não o passado. As linhas de consequência. As correntes invisíveis que ligam uma ação à sua reação. Aqui, cada um de vocês terá uma chance... de mudar uma dessas linhas. Mas tudo tem um preço.
Ryouma cerrou os dentes. Sabia exatamente o que aquilo significava. O Sistema Arkanum já havia liberado a função Reescrita de Causalidade, mas em nível teórico — ele nunca havia usado. E agora, o Véu trazia essa oportunidade.
— E o que se perde, se escolhermos reescrever? — ele perguntou.
A mulher sorriu, sem emoção.
— Memórias. Emoções. Vínculos. Cada linha que se altera... arranca algo em troca.
Tang San deu um passo à frente.
— E se recusarmos?
— Então tudo segue como está. A destruição permanece. Os futuros se alinham. A tragédia floresce.
O silêncio pairou pesado.
Ryouma olhou para o chão, depois para Tang San, e por fim para a mulher.
— Quero ver as linhas. Quero saber o que posso mudar.
A balança brilhou, e em sua mente surgiu uma teia de possibilidades. Cada ponto de luz era uma escolha. Cada fio, uma consequência. Ele viu o momento em que escolheu esconder seu segundo espírito marcial — uma escolha que lhe deu vantagem... mas também o distanciou dos outros. Viu quando manipulou um dos professores para obter informações sobre a Seita Tang. Viu quando protegeu um certo espírito espiritual raro apenas para negociá-lo mais tarde.
E então, viu algo que fez seu coração parar.
— Isso não pode estar certo...
Tang San olhou para ele, desconfiado.
— O que foi?
— Eu vi um fio... que conecta minha chegada a esse mundo com a queda futura da Seita Tang.
Tang San arregalou os olhos.
— O quê?
— Isso não deveria existir. Eu não fiz nada diretamente contra a Seita ainda. Mas está lá. O sistema... ou o mundo... já traçou uma linha entre mim e o fim dela.
Tang San respirou fundo, a mente em turbilhão. E pela primeira vez, sua aura revelou algo além da frieza calculada: medo.
— Você... está mesmo destinado a ser meu inimigo?
— Eu não escolhi isso. Mas talvez... eu tenha que aceitar.
A mulher os observava, impassível.
— O tempo está passando. Cada um de vocês pode reescrever uma única linha. Uma. Apenas uma. Pensem com sabedoria.
Tang San hesitou por um longo tempo. Até que seus olhos endureceram.
— Eu quero apagar o dia em que hesitei em usar o Martelo do Céu Claro pela primeira vez. Quero ter brandido essa arma com convicção desde o início. Quero ser forte o bastante para proteger... e para destruir, se necessário.
A balança vibrou. A linha foi reescrita.
Um fragmento da mente de Tang San foi apagado — uma memória específica de hesitação, de dúvida. Ele não se lembrava mais dela. E, em troca, um novo fio surgiu: sua conexão com o Martelo tornou-se mais profunda, mais instintiva... mas algo dentro dele havia escurecido.
Ryouma observou em silêncio. E então falou:
— Eu quero reescrever o momento em que salvei aquela criança da Vila da Fronteira. Em vez de deixá-la partir, quero tê-la levado comigo. Criado um laço verdadeiro com ela. Alguém... que me lembrasse quem eu sou.
A mulher ergueu a sobrancelha. A escolha era curiosa.
— Por quê?
— Porque estou cansado de ser um lobo solitário. E porque quero ter algo a perder.
A balança brilhou. A linha foi reescrita.
Ryouma cambaleou. Parte de sua memória se apagou — o momento em que negociou friamente o espírito daquela criança desapareceu. Em seu lugar, surgiu algo novo: imagens dele treinando ao lado da menina, rindo, ensinando-a a ler. Uma conexão emocional que não existia antes... mas que agora o ancorava.
A mulher guardou a balança.
— Terceiro Véu concluído.
O mundo tremeu. As chamas se apagaram.
E eles estavam de volta à escadaria.
Tang San parecia diferente. Mais firme. Mais sombrio.
Ryouma também mudara. Havia suavidade em seus olhos agora — mas também uma nova responsabilidade.
— Vamos seguir em frente — disse Tang San.
Ryouma concordou com a cabeça. Sabia que os próximos Véus seriam ainda mais cruéis. Mas, pela primeira vez, sentia que não estava simplesmente sendo empurrado por um destino estranho.
Ele estava escolhendo.
E o Sistema Arkanum, silencioso, exibia uma nova mensagem:
"Reescrita de Causalidade ativada com sucesso. Laço afetivo gerado: [Elena – A Pequena Guardiã]."
A verdadeira guerra, agora, não era apenas contra Tang San.
Era contra o próprio futuro.