A alvorada que surgia por trás das Montanhas Nebulosas tingia o céu com tons de cobre e cinza, como se os próprios céus pressentissem que o mundo estava prestes a testemunhar uma virada no equilíbrio de forças. A viagem de retorno para a Seita Nuvem Nebulosa não fora silenciosa — não por palavras, mas por pensamentos em ebulição. Cada passo de Ryouma e Tang San era uma guerra não declarada.
Tang San, mesmo tão jovem, era perspicaz demais para não perceber as mudanças em Ryouma. O garoto que antes se mostrava discreto e meticuloso agora andava com a firmeza de um assassino veterano. Seus olhos carregavam um tipo de foco que ia além de qualquer motivação comum — e isso perturbava Tang San.
Enquanto isso, Ryouma estava em constante comunicação com seu sistema.
[Sistema Harmônico da Ascensão]➤ Nova Habilidade Aprendida: Lâmina do Silêncio (nível 1)➤ Percepção Dimensional: ativada➤ Camuflagem Absoluta: condicionada à ausência de intenção hostil
A noite anterior havia sido reveladora. A alma de Ye Qingshui agora sussurrava em seus ossos. Ela não falava com palavras — mas sim com instintos, com lembranças de combates travados entre becos e palácios. Ela lhe dera uma nova lente através da qual observar o mundo. E Ryouma começava a ver com clareza onde e como deveria interferir.
Mas não era apenas Tang San que o preocupava. A Seita Nuvem Nebulosa o aceitara por conta de seu talento e comportamento controlado, mas havia olhos demais atentos ao seu crescimento. Mestres, discípulos, anciãos… todos tentavam entender como um jovem sem origem aparente, que não fazia parte de nenhum dos grandes clãs espirituais, conseguia evoluir com tamanha velocidade.
E como se isso não bastasse, algo mais se aproximava.
Na tarde do terceiro dia, ainda distantes da seita, os dois jovens encontraram o que restara de uma caravana. Riquezas saqueadas, carroças incendiadas, e homens mortos com cortes limpos demais para serem de bandidos comuns. Tang San agachou-se ao lado de um dos corpos e tocou o solo.
— Foi feito por um único indivíduo — disse ele. — Espada longa. Técnica precisa. Alguém altamente treinado… ou com um espírito de espada.
Ryouma já sabia. Antes mesmo de seu companheiro analisar o ambiente, seus sentidos, ampliados pela Percepção Dimensional, já haviam captado os rastros de energia espiritual deixados para trás.
E então uma nova janela do sistema apareceu:
[Alerta de Interferência Hostil]➤ Assinatura espiritual desconhecida detectada➤ Potencial de ameaça: Alto➤ Missão: Sobreviva ao Contato – Recompensa: Expansão do Núcleo Espiritual Primário
Não houve tempo para mais análises. Uma figura surgiu entre as árvores com um movimento quase preguiçoso, mas envolto em um manto de confiança letal.
Era um jovem — não mais velho que Ryouma ou Tang San — com cabelos prateados presos num rabo de cavalo. Vestia-se com trajes cerimoniais negros, adornados por símbolos de uma seita desconhecida. Em suas costas, uma espada de obsidiana exalava uma presença sufocante.
— Vocês são a nova geração? — disse ele, com voz firme, mas curiosamente desprovida de arrogância. — Interessante.
Ryouma deu um passo à frente, posicionando-se entre o estranho e Tang San.
— Quem é você?
O garoto sorriu.
— Xiang Wu. Herdeiro da Espada Fantasma Celestial. E estou aqui para testar os novos "favoritos do destino".
Tang San franziu o cenho.
— Espada Fantasma Celestial? Nunca ouvi falar dessa seita.
— Claro que não — Xiang Wu respondeu. — Porque destruímos nossa própria existência há um século. Somos sombras. Somos herdeiros da ruína. E agora, voltamos… para reconquistar o que é nosso.
Ryouma não esperou mais palavras. Seu corpo se lançou adiante com velocidade sobrenatural, ativando Camuflagem Absoluta no instante anterior. Tornou-se um borrão indistinto para os olhos comuns, e mesmo para Tang San, a presença de Ryouma pareceu desaparecer.
Mas Xiang Wu sorriu.
E num único giro de pulso, sua espada saiu da bainha com um som que rasgou o silêncio como um trovão.
O choque entre eles produziu uma onda de choque que explodiu árvores próximas. Ryouma foi lançado para trás, rolando três vezes antes de parar. Sua lâmina de energia estava rachada. Xiang Wu não parecia sequer aquecido.
— Camuflagem inútil contra os olhos que transcendem a carne — disse o inimigo. — Ye Qingshui era poderosa… mas até ela sucumbiria diante de minha linhagem.
Tang San finalmente se moveu, libertando a energia do Céu Misterioso e convocando sua Lança de Controle de Ervas. A grama prateada enrolou-se ao redor de seus braços, como serpentes famintas. Ryouma se ergueu, ofegante, mas sorrindo.
— Ótimo — disse ele, ativando Lâmina do Silêncio.
Desta vez, ele se moveu diferente. Não buscava mais ocultação. Ele era a própria intenção assassina materializada, e cada passo seu fazia o ar à sua volta estremecer. Tang San percebeu isso. Ryouma havia ultrapassado outro limiar. Algo que não devia ser possível tão cedo.
Juntos, os dois atacaram Xiang Wu.
A batalha que se seguiu foi algo que nenhuma lenda registraria, mas que os céus jamais esqueceriam.
Três gênios. Três futuros colidindo.
E apenas um deles carregava o sistema que evoluía com a dor, com a luta, com a superação.
No final, Xiang Wu desapareceu, ferido. Mas não derrotado.
E suas últimas palavras ecoaram por muito tempo:
— Vocês não são inimigos. Ainda não. Mas serão. Porque o trono do mundo só aceita um. E eu serei o último a cair.