Cherreads

Chapter 43 - Ecos na Névoa.

Capítulo – Ecos na Névoa

O primeiro vilarejo parecia desabitado. E morto.

As casas de madeira estavam intactas, sem sinais de batalha, mas as portas entreabertas e os mantimentos largados no chão contavam outra história. O silêncio era absoluto — nem um corvo, nem um cão, nem o farfalhar de vento entre as folhas.

Somente névoa. Uma densa, branca, fria como pele de cadáver.

— Algo está errado — disse Aelys, com a espada meio desembainhada.

— Está tudo errado — completou Orren, conjurando uma luz suave entre os dedos.

Tharion ergueu o punho fechado, sinalizando que todos parassem. Kátyra, atenta, respirou fundo. O cheiro era o pior de todos: carne apodrecida e flores — uma mistura que mexia com os nervos.

Avançaram pelas ruas estreitas até a capela da aldeia. A porta estava entreaberta. Dentro, o altar estava despedaçado, coberto de sangue seco.

— Aqui houve um ritual — disse Orren, trêmulo.

— Não. — Kátyra corrigiu. — Aqui houve uma oferenda.

E então, um som.

Fraco. Um sussurro.

Vindo de trás do púlpito.

Kátyra e Tharion sacaram ao mesmo tempo. Orren ergueu um escudo de luz. Aelys se adiantou... e parou.

— É uma criança.

Ali, encostada no canto, tremendo e de olhos vidrados, estava uma menina de talvez sete invernos. Vestia trapos, o cabelo embaraçado, a pele amarelada. Estava viva — mas não estava bem.

Ela os encarou, sem piscar.

— Ela tem... os olhos vazios — sussurrou Aelys.

Kátyra se ajoelhou, estendendo a mão devagar.

— Ei, pequena... como se chama?

A menina não respondeu. Apenas sussurrou algo, muito baixo. Orren se aproximou e ampliou o som com magia.

A voz infantil ecoou no salão:

— Eles vieram montados em sombras. Disseram que o menino abriu a porta. Que o coração dele é uma chave...

Silêncio.

Kátyra ficou gelada. Tharion se enrijeceu.

— Que menino? — ele perguntou, tenso.

A menina olhou diretamente para Kátyra. E murmurou, num tom quase reverente:

— O príncipe da luz caída. O filho do sangue dividido.

Ele grita enquanto dorme.

Ela então tombou para o lado, desacordada.

-

Ecos na Névoa (continuação)

Mais adiante, o grupo encontrou corpos de animais empilhados nos celeiros, sem olhos e com símbolos talhados no dorso — o mesmo glifo encontrado na prisão de espelhos, o selo Darxa da "ceifa interior". Aparentemente, alguém estivera testando algo ali. Um ritual de absorção ou conversão.

Na última casa, Orren encontrou um pergaminho rasgado, parcialmente queimado, com uma frase clara, escrita em sangue:

"Quando a chave sangrar, a Torre cairá."

Kátyra segurava o pergaminho com dedos trêmulos.

— Eles estão vindo por ele — disse.

— Estão usando vilarejos inteiros como teste — completou Aelys.

— Não... como teste — murmurou Tharion. — Como oferta.

---

Enquanto isso…

Em algum ponto entre o sono e a morte, entre véus que nem os Guardiões ousavam nomear, Titos flutuava. Um campo de névoa dourada se abria ao redor, e ao longe, uma mulher de cabelos brancos e olhos como cristal caminhava descalça entre espelhos quebrados.

— Moira...? — sussurrou ele, com a voz fraca.

Ela se ajoelhou, tocando-lhe a testa. Seus olhos estavam cheios de tristeza e fúria contida.

— Meu menino. Você foi marcado antes mesmo de nascer.

— Eu... estou morrendo?

— Não. Você está acordando.

O mundo se distorceu. A névoa dourada virou cinza. Estilhaços de espelhos voaram para longe. E então, das sombras, uma presença familiar surgiu: Erizy, de olhos negros como breu, envolto em chamas escuras que pareciam sussurrar palavras proibidas.

— Olha só... — disse ele, com um sorriso distorcido. — O filhote acordou cedo demais.

Moira ergueu a mão, e um círculo de runas brilhou no chão.

— Você não tem direito de estar aqui, Ataxa!

Erizy riu.

— E você não tem força para me impedir.

— Ele é sangue do Norte. Herdeiro da luz.

— Ele é meu legado inacabado.

Erizy avançou. Moira se postou entre ele e o menino. As sombras tentaram tocá-lo, mas falharam — um brilho prateado surgiu do peito de Titos, empurrando o sombrio para trás.

Erizy grunhiu.

— Ele tem o sangue do pacto, mas o corpo da esperança. Isso vai matá-lo. Ou... libertá-lo.

Moira abraçou o menino.

— Acorde, meu querido. E não ouça as mentiras dos que caíram.

---

De volta ao mundo real...

Titos se remexeu na cama, em febre intensa. A curandeira gritou:

— Ele está reagindo! As veias estão brilhando!

Cora, de olhos inchados, segurava a mão do filho. Um grifo montado por um mensageiro desceu no pátio do palácio com notícias urgentes: Kátyra encontrara pistas que apontam para a Torre de Sanguinar, um lugar onde o tempo sangra e os mortos sussurram.

E o tempo estava acabando.

---

More Chapters