Capítulo 1 – Doce demais para acordar
> Alice tinha catorze anos e odiava aniversários.
O quarto dela parecia o ninho de uma tempestade: livros abertos, roupas jogadas, papel de bala grudando no carpete. Um único pôster na parede — amarelado pelo tempo — mostrava uma ilustração antiga: uma mesa de chá, rabiscada a lápis.
No canto inferior, quase apagado, o sorriso de um gato.
Era noite. A luz do abajur piscava. E quando o sono chegou, ele veio como um redemoinho.
Primeiro, a gravidade desapareceu. Alice caiu... ou flutuou? Não sabia dizer.
O chão sumiu.
O teto se tornou um céu lilás.
E então, veio o crescimento repentino — braços longos demais, pernas arrastando as nuvens.
Ela gritou, mas a voz saiu em forma de bolhas. Quando tentou correr, foi diminuindo.
Encolheu tanto que precisou escalar um cogumelo para respirar.
E quando se virou, estavam lá:
Guardas com roupas de cartas de baralho, correndo atrás dela. As lanças pareciam feitas de lápis quebrados e os escudos tinham espelhos — e todos refletiam o rosto dela, distorcido.
Alice segurava algo nos braços:
Três doces. Três gomas brilhantes, com olhinhos piscando e sorrisinhos. Gêmeos? Talvez. Mas pareciam estar rindo dela.
— Eles vão derreter... se você não correr — sussurrou uma voz, em todos os cantos.
Era um sussurro com dentes.
O chão rachou.
As cartas guardas pularam.
E no instante antes de tudo se apagar, ela viu no céu:
Aquele gato.
Só o sorriso.
E os olhos... brilhando como duas luas deformadas.
Quando acordou, ofegante, estava em sua cama.
O pôster da parede?
O desenho do gato tinha mudado.
O sorriso era maior. E os olhos, agora, brilhavam no escuro.